Nas grandes
capitais do Brasil e do mundo afora, a arte de rua domina a paisagem urbana.
Qualquer tipo de suporte, seja ele um muro, uma fachada, ou um hidrante, vira
tela para o artista. E, mesmo que não tenhamos nenhum conhecimento a respeito
do autor, vamos nos familiarizando com os traços e as cores próprias de cada
grafite.
Nas cidades
interioranas, o grafite também está presente, mas em escala bem reduzida,
provavelmente, devido ao velho conservadorismo... E isso ficou bem claro,
durante essa semana, aqui em Nova Friburgo, região serrana do Rio de Janeiro. Domingo
passado, dia 27, quem passava pelo centro da cidade, foi surpreendido pelo trabalho
do artista pernambucano Derlon Almeida na fachada do prédio da Usina Cultural. A
antiga parede branca estava dando lugar a uma obra de arte!
Primeiros traços de domingo.
O trabalho do
Derlon é bem diferente dos grafites populares. Suas intervenções são inspiradas
no método de xilogravura, técnica de gravação em madeira e que se tornou muito comum
na literatura de cordel, manifestação artística típica do nordeste brasileiro. Os seus traços fortes em preto e branco já foram motivo de surpresa, mas, acredito eu, que a falta de hábito dos friburguenses diante da arte de rua
também foi um grande fator para o sobressalto geral.
Não teve uma
pessoa que não parasse para admirar o trabalho, mesmo se estivesse dirigindo e
atrapalhasse um pouquinho o trânsito! A comoção foi geral, sem dúvida,
principalmente, porque a imprensa ainda não tinha dado conhecimento do fato. Todo
mundo queria bater uma foto ou dar uma palavrinha com o artista. Eu, claro,
muito curiosa, aproveitei um momento de descanso do Derlon pra fazer umas
perguntas a respeito do novo trabalho.
Em primeiro
lugar, devo ressaltar a simplicidade do rapaz. Apesar de já ter exposto seus
trabalhos nos principais centros artísticos do mundo, como Paris, Londres e
Amsterdã, ele é muito simpático, atencioso e humilde. E, diante do seu
histórico, a minha primeira questão foi sobre a sensação de produzir
um trabalho no Brasil e numa cidade do interior como Nova Friburgo. Para ele,
fazer uma intervenção num município pequeno é mais significativo do que nas capitais,
isso porque, o ritmo da cidade é quebrado, a sua obra ganha mais visibilidade e
importância para a população, o contrário do que acontece num grande centro urbano.
Derlon também me contou que foi a primeira vez que visitou Nova Friburgo, uma
cidade que só conhecia de nome, e que estava muito feliz por poder deixar um
trabalho inédito para a população.
O prédio onde
foi feita a obra de Derlon, propriedade da empresa de energia elétrica
Energisa, é um imóvel antigo, datado da primeira metade do século XIX, mais precisamente,
1845. Está situado numa das esquinas mais movimentadas da cidade. Foi
propriedade de Antonio Clemente Pinto, o Barão de Nova Friburgo, e lhe servia
como adega e depósito de materiais de viagem. Inicialmente, era uma casa térrea
com porta central e duas janelas de cada lado. Mas, em 1923, foi reformada e
passou a ser um sobrado com dois pavimentos, características que são
preservadas até hoje. Devido a sua importância histórica, este imóvel, bem como
outros, foi decretado patrimônio cultural pelo município em 2012.
O prédio anteriormente. Crédito: Google Maps
Diante dessa informação, perguntei ao
Derlon se ele já tinha grafitado em um bem tombado e qual era a perspectiva de
poder fazer um trabalho num imóvel protegido. Ele me disse que já tinha passado
pela experiência de grafitar uma igreja, mas que os trabalhos foram apagados
pelo padre responsável. Ele também se mostrou muito surpreso em saber que o
imóvel é considerado patrimônio histórico. Para mim, a produção artística, além de não interferir nas
características do imóvel, promoverá a sua proteção através da conjugação do
antigo e do contemporâneo.
E agora com nova cara!
A intervenção
foi uma iniciativa do Festival Sesc de Inverno que teve como tema a arte de
rua. O objetivo era proporcionar a interação entre o cotidiano urbano e manifestações
artísticas, principalmente o grafite. Mais do que um belo presente, tenho
certeza que a obra de arte do Derlon vai além do embelezamento da cidade.
Durante quatro dias, a população assistiu ao espetáculo de um artista, interagiu
com ele, mesmo que à distância, ao admirar e reconhecer a beleza de seu
trabalho. Acredito que, a partir de agora, os friburguenses vão olhar a sua
cidade com outros olhos, ao reconhecer o valor de um local bonito e agradável e
a importância de mantê-lo conservado!
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